terça-feira, 13 de novembro de 2007

Microsoft desenvolve tradutor de documentos para cegos


FRANKFURT (Reuters) - A Microsoft e o consórcio de audiobooks DAISY estão trabalhando juntos numa ferramenta que permitirá aos deficientes visuais a traduzir documentos do Microsoft Word em padrões de áudio digital.

As duas organizações afirmaram nesta terça-feira que a colaboração tem como objetivo a produção de um programa gratuito de tradução de documentos escritos em Open XML --o formato padrão de arquivo para documentos do Microsoft Office 2007-- para o formato DAISY XML.

O arquivo DAISY XML poderia então ser processado para produzir áudio digital e outros formatos de exibição. A expectativa é de que o programa plugin esteja disponível no início de 2008.

O consórcio sem fins lucrativos DAISY (Digital Accessible Information System), com sede em Zurique, foi formado em 1996 por bibliotecas de audiobooks para ajudar na transposição de livros de áudio do formato analógico para o digital, e adotou um padrão livre com base em formatos de arquivos de Internet.

Entre seus membros estão o Serviço de Biblioteca Nacional dos Estados Unidos para Cegos e Portadores de Deficiências Físicas, a Organização Espanhola para Cegos e a Biblioteca em Braile da Coréia.

A Microsoft está em campanha para ter seu formato de documento Open XML aprovado como padrão internacional, o que ajudaria a empresa a ganhar aceitação de organizações do setor público.

A companhia não conseguiu a maioria necessária em setembro numa votação da Organização Internacional para Padronização (ISO), particularmente devido à preocupações de que o formato não seja realmente livre, mas apenas uma tática para prender o usuário em uma tecnologia.

Um grupo da ISO irá se reunir novamente em fevereiro para tentar chegar a um consenso, o que dá à Microsoft mais tempo para angariar votos.


Fonte: Reuters Brasil
http://br.reuters.com/article/internetNews/idBRN1355158520071113

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Despertar o prazer da leitura (Ceará)


Ações promovidas por ONGs, escolas e comunidades fazem da leitura uma ação transformadora

A educação é apontada como a solução milagrosa para todos os problemas do Brasil, sobretudo os ligados à violência. No entanto, no Ceará, mais de 1,7 milhão de pessoas não sabem sequer ler e escrever, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os projetos do governo alfabetizam e as crianças estão em sala de aula, mas são poucas as que conseguem entender o que um aglomerado de palavras — que chamamos de texto — significa. Essa deficiência faz com que a leitura não seja uma atividade prazerosa.

O futuro do Brasil depende da formação de leitores, não leitores funcionais; de placas de ônibus e bulas de remédio, e sim de leitores que saibam avaliar histórias, artigos, resenhas, enfim, qualquer gênero textual e usá-los no cotidiano. Para ocupar esse vácuo deixado pelas escolas, a sociedade civil tomou para si a responsabilidade de despertar o prazer da leitura nos mais de 326 mil jovens cearenses entre oito e 29 anos que não dominam a escrita.

Nascem assim as bibliotecas comunitárias. Espalhadas pelas periferias da Capital, elas mudam a realidade de pobreza e exclusão em que vivem milhares de crianças e jovens. “Eu aprendi a ler de verdade na biblioteca. Antes, eu só olhava as figuras, agora entendo o livro todo. Minhas notas até melhoraram no colégio”, conta Antônio Márcio Bezerra de Lima, de 15 anos. Eles e mais outras 80 crianças do bairro Bela Vista freqüentam todo os dias a biblioteca comunitária Mary Mona Kelly.

Com os livros nas mãos, eles se tornam herdeiros de um legado imaterial dominado por uma nobreza intelectual brasileira. “Através da leitura, aprendem a ser cidadãos”, diz a coordenadora da Biblioteca, Maria das Graças Raulino da Silva. Há quatro anos, a pequena biblioteca surgiu como uma iniciativa para tirar os meninos e meninas da ociosidade. Com a ajuda financeira e pedagógica da Organização Não Governamental canadense “I Can Foundation”, o espaço se tornou o orgulho da comunidade.

A diretora executiva da ONG canadense, Jacquie Rashleigh, explica que mais outras duas bibliotecas comunitárias são mantidas em Fortaleza com as doações trazidas do Canadá. As outras duas unidades funcionam no Pirambu, na comunidade Terra Prometida, e no Planalto Pici. Além do acervo para consulta e empréstimo, as instituições realizam outras atividades educacionais e culturais com as crianças dos bairros e oferecem lanches durante as atividades, uma forma de garantir a permanência e concentração dos pequenos.

Há ainda outras iniciativas semelhantes nos bairros Messejana, com a Biblioteca Gaivota e no Conjunto Ceará, onde estudantes do Curso de Ciências da Informação da Universidade Federal do Ceará (UFC) estagiam. Este ano, mais duas bibliotecas comunitárias foram inauguradas, uma no Parque Genibaú e outra no Carlito Pamplona, como parte do projeto “Eu gosto de ler”, organizado pela vereadora de Fortaleza, Fátima Leite.

De acordo com a vereadora, outras seis comunidades manifestaram o desejo de ter um equipamento com livros didáticos e paradidáticos que possam conquistar mais jovens para o mundo das letras. Mais do que locais onde estudantes e a população, de modo geral, podem pegar livros na forma de empréstimo, as bibliotecas comunitárias consistem em espaços para reforço escolar e transformações sociais.

A vida de Francisco Gael Alves Pereira é outra depois que ele começou a ir para a biblioteca Mary Mona Kelly. “Antes eu vivia na rua e não era bom aluno. Hoje, eu gosto de ler e já li 20 livros este ano”, conta o menino. Os romances e histórias fantásticas são o grande atrativo da criançada, que depois envereda pela história e geografia do País, sempre descobrindo mundos novos.

HISTÓRIAS ENCANTADAS

Contato com os livros deve começar antes da alfabetização

O gosto pela leitura pode ser estimulado desde cedo, quando mal as crianças saem do berço. Com o ouvido atento, os pequenos escutam as histórias de fadas, bruxas e castelos encantados com admiração e assim têm o primeiro contato com o mundo da literatura. A participação da família é decisiva nesse processo, pois com a ajuda dos pais a leitura deixa de ser obrigatória e se torna um programa de família, passando a fazer parte do cotidiano das crianças.

O contato com a leitura deve começar antes do processo de alfabetização. Como explica a psicopedagoga Ana Ásia Almeida, no período de zero a seis anos de idade, a leitura é tratada de forma auditiva com as crianças. “Elas escutam, olham as imagens e imaginam as histórias”, observa. Na escola da rede privada em que ela atua como coordenadora pedagógica, desde muito cedo a leitura é estimulada com os alunos.

Eles participam de situações sociais de leitura e escrita. Uma dessas situações é a leitura de fim de semana. Na sexta-feira, as crianças levam um livrinho para casa e os pais devem ler a história para eles. Essa leitura, afirma a psicopedagoga, deve ser descompromissada, sem o peso de uma atividade pedagógica da escola. “Atrelar a leitura a um trabalho da escola é errado”, frisa Ana Ásia.

Aos pais, cabe não apenas ler o conteúdo do livro, mas narrar essa história, fazendo uma dramatização que envolva o filho no mundo de fantasia da história, a ponto deste se sentir parte dela. “As crianças se tornam quase um co-autor da história. Elas predizem os eventos e tendem até a mudar o final”, observa a coordenadora pedagógica. Além disso, a leitura das fotos é muito importante. Descrever as cenas ajuda as crianças a compreender o livro e a ter um senso crítico.

Mas os pais não devem esperar apenas pela iniciativa da escola para manter uma situação social de leitura. Há muitos títulos infantis que podem ser adquiridos e trabalhados em casa de modo a estimular a leitura. Ana Ásia aconselha os pais a comprar livros atrativos, de tamanho grande, com imagens coloridas e que deixem transparecer uma certa harmonia visual.

Em relação ao conteúdo, as histórias clássicas, como “Chapeuzinho Vermelho”, “Branca de Neve” e “Os Sete Anões” e “Cinderela”, são mais indicados para meninos e meninas depois dos quatro anos de idade. Antes disso, são preferíveis histórias com animais que já fazem parte do repertório cultural dos pequenos leitores.

A leitura ganha contornos lúdicos com a adição de canções, dramatizações e uso de fantoches. O mundo da literatura já é atrativo por despertar a capacidade de imaginar nos adultos e para a meninada ele é um convite à fantasia e à brincadeira. “A criança vive em um mundo imaginário e a literatura combina com isso, a leitura passa a ser então um desafio gostoso”, avalia a psicopedagoga Ana Ásia.

CASA DO CANTADOR

Acervo privilegia a literatura cearense

Michele de Sousa Araújo sai todos os dias do Álvaro Weyne para estudar na biblioteca da Casa do Cantador, no Carlito Pamplona. Ela e os amigos já criaram o hábito de ir todos os dias ao local para fazer as tarefas escolares e depois das lições, entre uma prateleira e outra, encontram uma história que ainda não conheciam ou uma poesia popular que ainda não tinham lido.

Reinaugurada com um acervo maior em julho deste ano, a biblioteca faz parte do projeto “Eu gosto de ler”, coordenado pela vereadora Fátima Leite, e já conta com um acervo que privilegia a cultura e produções locais, com destaque para os cordéis e livros raros, que não podem ser encontrados nas livrarias da Cidade.

“Tudo isso é pela cultura e pelas crianças”, frisa o diretor da Casa do Cantador, Dimas Mateus, também poeta popular. A biblioteca conta com 22 voluntários, que se dedicam a cuidar dos livros e das crianças. “Nosso desafio é estreitar os laços com as crianças para que elas leiam cada vez mais”, afirma a comerciante Tânia Lima do Nascimento, voluntária.

Por enquanto, a biblioteca não está trabalhando com empréstimos, pois ainda estão em processo de catalogação do acervo, explica Roosewelt Lins da Silva, bibliotecário responsável pelo projeto. Ele observa que o modelo de bibliotecas comunitárias está se expandindo rapidamente no Ceará, mais até que em outros Estados do Nordeste.

Essa demanda, frisa Roosewelt Lins, mostra a necessidade de investimentos em políticas de incentivo à leitura. Por conta disso, no próximo dia 20, será realizado o I Seminário de Incentivo à Leitura, no Auditório da Câmara Municipal de Fortaleza, que tem como objetivo discutir a prática de leituras em Fortaleza.

Artigos nobres, mas perigosos

NAIANA RODRIGUES
naiana@diariodonordeste.com.br

A deficiência de leitura dos brasileiros não deriva da concorrência do livro com os meios eletrônicos. Ela está na raiz da formação do Brasil como Estado-Nação. A entrada dos livros no período colonial só foi permitida no ano final do século XVIII. Apesar da proibição, eram trazidos ilegamente da Europa e comercializados no mercado negro. Essa barreira significava uma estratégia do processo de colonização, pois a leitura de obras iluministas poderiam insuflar revoluções. Por conta desse poder, os livros sempre foram uma ameaça aos governos autoritários. Na Alemanha nazista, milhares de livros que se opunham ao pensamento do Füher foram queimados em praça pública, o que é uma afronta à história da humanidade. No entanto, mesmo em tempos de “democracias”, o livro ainda enfrenta resistências. Desta vez, provocadas pelas leis de mercado, que fazem deles artigos de luxo. Se são muitos os analfabetos funcionais no Brasil, poucos são aqueles que têm condições financeiras de adquirir livros, seja para o estudo ou para o deleite. O livro continua sendo um artigo da nobreza, da classe hegemônica, portanto, iniciativas de bibliotecas comunitárias e grupos de leitura são uma prova de resistência e de autonomia.

Hábito de ler é essencial para a escrita

OPINIÃO DO ESPECIALISTA
JOSÉ LEMOS MONTEIRO *
jolemos@unifor.br

A importância da leitura se torna consensual a partir do princípio de que alguém só adquire e desenvolve a habilidade de escrever se aprender a ler. São dois processos solidários: ninguém aprende a escrever bem se não for um bom leitor. A leitura também é uma condição essencial para que o aluno entenda um texto.

Se ele não tem o hábito de ler, não vai ter referenciais para entender o conteúdo daquilo que está escrito. É essa incapacidade de compreender os significados de um livro ou de um texto qualquer que compõe o quadro do analfabetismo funcional.

O leitor consegue ler o texto, mas não tem referenciais para compreender os significados dele. Uma outra conseqüência do hábito de ler é a abertura para o aprendizado. Para que o aluno aprenda, ele precisa ter a capacidade de compreender os ensinamentos do professor. Primeiro ocorre a apreensão das idéias, segundo a compreensão e a terceira fase é a aprendizagem em si.

A leitura está, pois, diretamente inserida nesse processo. Hoje, com outros meios de comunicação mais ágeis não há muita motivação para a leitura. Mas a escola pode mudar isso utilizando certas estratégias, uma das quais a de possibilitar de que o aluno tenha acesso a textos de boa qualidade literária que, sem dúvida, constituem um instrumento de prazer.

Se a escola apresentar textos pobres e inexpressivos, não irá motivar o aluno. Esse trabalho deve começar nas séries iniciais, para que o aluno não acumule deficiências ao longo do tempo e chegue à Universidade sem querer ler.

* Professor do Curso de Letras da Unifor

Naiana rodrigues
Repórter

Fonte: Diário do Nordeste
http://diariodonordeste.globo.com